A muitos parece utópica a ideia de criar em 2019 ou 2020 uma comunidade. Argumentam que agora as pessoas são muito individualistas e que cada um quer realizar o seu sonho, o seu projecto, que as pessoas são muito mais egoístas e mesmo egocêntricas, muito menos dispostas a aceitar as faltas dos outros, sobretudo se isso os atingir directamente.
Não deixam de ter razão e, em geral, são pessoas de bom senso.
Numa comunidade, como numa família ou empresa, o mais importante são as pessoas. Quem somos e com quem queremos compartilhar a nossa vida.
Uma comunidade terá assim que ter objectivos muito claros, um sistema de selecção apurado e faseado no tempo, um processo de tomada de decisão e de prevenção de conflitos bem definidos.
Quando se fala de uma comunidade integral está-se a pôr a barra muito alto, mas na única fasquia que parece sincrónica com o estado de evolução de consciência do planeta.
Integral ou holístico significa que as coisas são vistas como um todo, em que tudo está interligado e tudo se inter-influencia. Tanto a nível pessoal como social e nacional, o económico está ligado ao afectivo, o político ao espiritual, o criativo ao habitacional, o alimentar á saúde. Nada é uma ilha. Quando uma parte de nós, individualmente ou como nação, não funciona todas as outras são tingidas por isso.
Certamente que criar uma comunidade tem algo de utópico. Sobretudo quando essa comunidade não tem um objectivo social, político ou espiritual bem demarcado, quando essa comunidade não arvora um líder reconhecido num desses campos, quando ela é aberta e quer aprender com a sua evolução e quando acredita que todos os seus membros terão algo de vital a contribuir, algo que enriquecerá a vida de todos os outros.
EDESTA define-se como uma comunidade integral e holística porque o seu funcionamento, que, de certo modo, já está a começar a ocorrer, se baseia em quatro pilares básicos:
A permacultura e construção ecológica, o trabalho psicológico, social e de família, a criatividade artística ou outra e finalmente, a espiritualidade.
Destes quatro pilares o que suscita mais interrogações é o espiritual, o pólo da consciência. Numa fase de descrédito das religiões organizadas, numa fase de materialismo crescente, em que o quantitativo, o dinheiro, os factos, as estatísticas e os mitos do progresso, do cientismo, do consumo e do crédito se tornaram como que dogmas de uma nova religião laica, arvorar a bandeira do espírito levanta interrogações.
Desde o seu início que EDESTA afirma que a sua espiritualidade é aberta, sem imposição de crenças, cultos ou rituais. Contudo, nesta fase de fragmentação, dispersão e multiplicação em todos os domínios, desde o emocional ao financeiro, é necessário haver um centro, um ponto de convergência que todos estejam interessados em aprofundar. Para além do sonho individual de cada um dos seus membros, terá que haver um objectivo pelo qual se trabalha em comum.
Todos somos diferentes e cada um terá o seu nível de consciência social, ética ou espiritual. Uns gostarão mais de fazer certas coisas e outros, outras. Uns serão mais sonhadores ou celebradores e outros serão mais planeadores ou executores. É na complementaridade, na sinergia e na potencialização do esforço de cada um que EDESTA aposta.
O objectivo final que EDESTA propõe a quaisquer candidatos é o de trabalhar para o Uno. Parece de novo uma fasquia muito alta, sobretudo porque cada um o vê ou sente á sua maneira, segundo o seu ângulo de visão. Mas parece ser esse o desafio: ultrapassar o nosso ego e expressar o uno que tudo liga e através de nós se manifesta.
Quando se fala de ego refere-se a parte de nós que separa, compara e julga, aquela que impede a união, o amor, a apreciação dos outros, que dificulta o trabalho em equipa, que é movida pelo espírito da competição não saudável, que vê o proveito dos outros como uma perda sua.
Nesta visão holística, os quatro pilares das actividades da comunidade complementam-se e apoiam-se uns aos outros. Porque tudo é uno, o viver na natureza ajuda às emoções de cada um, o fazer meditação ou comer saudável ajuda a resolver conflitos, o viver numa casa feita em materiais naturais ajuda á harmonia com o universo.
Outro pilar que suscita a interrogação é o psicológico, o social, o das relações familiares. O que ele significa é que buscamos a transparência, a honestidade, a verdade, a confiança, a solidariedade, a inocência e a impecabilidade. E que isso deve ser trabalhado, um esforço continuado de autoconhecimento. É essa a base: se não houver um interesse e um empenhamento em conhecer-se a si próprio e em estar aberto a ouvir o que os outros pensam de nós não vale a pena querer estar numa comunidade integral.
Quando se fala do polo artístico, está-se a sublinhar que a descoberta e expressão da sua criatividade própria são essenciais ao ser humano. Está-se também a reafirmar a fé em que todo o ser humano tem uma faceta artística ou criativa que merece ser apoiada.
Quanto ao pólo da permacultura e da construção ecológica, ele, para além do prazer desse trabalho com a natureza, suas sementes e seus materiais de construção, está-se a activar uma ligação essencial com o todo. Na realidade, o trabalho, como já foi dito por Lanza del Vasto, é menos para fazer produtos do que para fazer o homem. A partilha em tarefas comuns - ainda que para benefício mais directo ou imediato de um dos participantes - será sempre vista como um enriquecimento: não só como uma aprendizagem de novas técnicas e formas de fazer as coisas, mas como uma criação ou fortalecimento da consciência grupal.
Desta forma, os quatro pilares interligados de EDESTA formam uma espiral ascendente do uno para o uno. Assim, é necessária a consciência, maior ou menor, dessa inter-relação para sentir que o uno está em tudo e que tudo é uno. Só assim se poderá caminhar como um todo em direcção ao uno. O uno que por essência já somos.
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