top of page
João Motta

O SISTEMA DOS ESPELHOS

Esta tese visa demonstrar que aquilo a que se chama vida humana no planeta Terra é, na realidade, um sistema de espelhos.

Fundamento teórico:

Só o uno é real, verdadeiro, permanente, eterno, sem diferenças. O espelho é a ilusão da dualidade, o sonho do exílio, onde o erro se considerou pecado.

O espelho é o do espaço tempo, o ecran tridimensional onde demonstramos a separação. Os sentidos são os botões e cabos da consola através da qual projectamos o corpo e o mundo, eles dão-nos a confirmação do que queremos ver e sentir.

O mundo é neutro, nós damos-lhe significado. O corpo é inerte e sem vontade. A mente anima-o, impõe-lhe planos, intenções e máscaras que lhe roubam energia e o levam à doença, á dor e á morte.

Considerações práticas:

O que é um espelho? Aquilo que nos mostra o que julgamos ser: um corpo, atrelado a uma mente separada, das outras e do mundo. Uma personalidade, uma individualidade, um veículo que circula pelo cenário do espaço-tempo.

O que fazer? Render-se à evidência. Reconhecer que o nosso projecto falhou.

Algumas explicações:

Os outros são o nosso alibi. A prova que temos que continuar a lutar. Para impor a nossa visão do mundo, a nossa vontade e as nossas crenças, ilusões e interesses aos outros. Ajudar os outros? Fuga á verdade. Cura-te primeiro a ti próprio. Queres ajudar os outros para evitar veres-te primeiro ao espelho. Abre-te primeiro a reconhecer as deformações, as sombras e os monstros que o teu espelho deformado te mostraria. Busca com mais ardor o ser e depois virá o fazer e o ter.

Os outros são SÓ o nosso espelho, querer ajudá-los é como pintar outras caras sobre um espelho. Eles não têm culpa de ainda nos sentirmos incompletos, de ainda termos medos, de ainda sentirmos culpa. Culpa de ter feito algo de errado. Algo de que já não nos lembramos…

Temos medo de esquecer a entrada no labirinto onde nos encontramos, o caminho que fizemos nesta explosão de incarnações paralelas, que só existem no espelho deformado do tempo. Neste labirinto, a busca do orgasmo é a busca de Deus. Só nele o ego se esvai, só em Deus não há busca.

As paredes do labirinto onde entrámos (julgando que isso ocorreu quando nascemos), por vezes parecem de ferro, por vezes um nevoeiro. Mas, na realidade, são de espelhos. Pois projectamos o que somos, o que julgamos ser e assim julgamos o mundo. Cada um vive no seu mundo e faz os negócios e transigências -com o exterior, com os outros- que julga melhor lhe servirem para manter e tentar impor a sua visão do mundo- Por exemplo: “que todos sejam arianos!”, ou “bondosos, altruístas e compassivos”, ou “amantes da ordem, do decoro e do protocolo”.

A prática dos espelhos, a forma de sair do labirinto é entregar a Deus os meios e as técnicas que usámos para nos separar Dele. Dito de uma forma agnóstica: ver unidade na separação, ver complementaridade na oposição, ver completude na carência. Saber que tudo é perfeito, que tudo é possível. Que tudo tem o seu porquê e para quê.

Quais são esses meios e técnicas? Formam um sistema muito complexo, que por vezes parece complicado. A base desse sistema é a de que o ego não existe, mas foi imaginado (e a ele lhe foi dado o nosso poder), para nos proteger e guiar ao longo da vida. Como não existe, sofre de falta de identidade e está obcecado por mostrar que é real, diferente e especial.

O ego somos nós, os separados, os solitários. Que pensamos nascer, viver e morrer. Que fazemos o contrato social para podermos fluir melhor no cenário que se nos parece impor do exterior.

Quando o mundo objectivo está dentro da consciência subjectiva. Como os cientistas têm vindo a reconhecer…

E, como disse o Buda, o problema é o desejo, ou, como disse Pascal, o problema é o homem não se contentar com viver no seu quarto… ou seja, desejar cria separação e dualidade. Só desejamos o que julgamos não ser, o que nos complementa ou completa, o que está fora de nós e nunca nos satisfaz.

A prática oposta é estender o uno a partir do nosso coração, ver os outros como as partes de nós que vamos recuperando, aquelas que vamos reconhecendo e aceitando. Reconhecer que o que não aceitamos, julgamos ou criticamos nos outros, são as partes de nós que não queremos ver, são as nossas dúvidas que andam por aí.

Podem mostrar-nos espelhos que admiramos (os actores de cinema, os bonitos, os ricos, os poderosos, os santos), ou que rejeitamos (os pedintes, os desonestos, os falsos, os arrogantes, os ignorantes). Mas somos tudo isso, ou antes, os nossos egos e comportamentos incluem toda essa gama de características e atitudes. Com eles aprendemos.

Só nos podemos ensinar a nós próprios, pois somos o uno disfarçado de multiplicidade. Os outros, de forma consciente ou inconsciente, para eles e para nós, estão a servir-nos de espelhos, em permanente mutação. Pelo que há que estar muito atento e não cair no piloto automático da separação. Os outros são os actores ou figurantes do nosso filme, assim como nós o somos no filme que eles estão a sonhar ou realizar. Cada outro tem uma certa chave para uma certa porta ou mesmo portal do labirinto do nosso ser. Cada um mostra-nos um caminho, um ângulo, um veículo para a nossa caminhada neste jogo. No jogo onde representamos o papel do Filho Pródigo que somos. Narciso que se deixou hipnotizar pelo espelho. Como o espelho das águas está em constante mutação e nós adoramos o movimento e a variedade vamos ficando enlevados na nossa própria imagem. Amamos o espelho distorcido do mundo. É o nosso alibi. Queremos que o sonho continue. A verdade é que não queremos despertar. Pelo menos conhecemos o conhecido…Conseguimos fazer respeitar a nossa zona de conforto.

Mas não faz mal, tudo é perfeito. O filme já acabou, estamos só a vê-lo em camera lenta. O pano de fundo é o uno -intocável e compacto nos seus filamentos de vazio- que é a joia multifacetada de luz que brilha em tudo e em todos. É nessa luz que as formas e cores aparecem, é nela que brilham. Somos a luz que permite a aparição do mundo. É na consciência que aparece o espelho do mundo.

Sem que isso seja suspeitado, no sistema de espelhos, ensinar e aprender é a mesma coisa, dar e receber é a mesma coisa. Ou seja, o que está por detrás do espelho é uma armação unitária, que não julga nem separa, para quem a quantidade não existe. Essa armação gloriosa é como um espelho, que, por definição, é neutro. Ela é como uma camera, que não julga o que lhe aparece, que só dá mais luz onde está mais escuro e que aceita completamente os filtros com que queremos ver a realidade exterior. Ela é como um cenário a quem não importa a peça que nela se representa.

Um dia, no filme do tempo, o teu reflexo nos outros tornar-se-á evidente. Não poderás mais negar que te moves através dos outros, que eles dizem o que tu estás a pensar, que eles expressam a dansa da tua harmonia. Então, as tuas acções não serão mais premeditadas, pois saberás que planear era só uma falta de confiança. Saberás então que a tua criatividade é infinita, que és ilimitado e sem mácula. Que sempre foste inocente e que a separação nunca ocorreu.

Conhecerás assim o Deus Uno que és e saberás que nada mais é.


Serás o Amor que tudo é.

O Amor que venceu a ilusão do tempo e da separação.

O Amor que tudo liga e tudo une.


A tua eternidade não terá espelho.

A nossa vida é um labirinto de espelhos...

42 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Butoh Self

Comments


bottom of page