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João Motta

Fragmento Gnóstico

Atualizado: 27 de mai. de 2019


Publicado : 1997-3-1


... Fui humano, fui humana, conheci as grandezas e as misérias que são fruto dos desejos. Conheci todas as dimensões do espaço. Arrastei-me nos abismos mais profundos onde a luz não chega e o tempo não passa. Carregada de lodo e de lama clamei pelo regresso à minha condição. Cheguei a perder por completo a memória da origem e encolhi-me imóvel no mais abjecto desespero. Desligada das minhas raízes celestes, deixei-me levar pelos furacões, deixei que os meus membros fossem dispersos pelos ventos. Desci aos inframundos que se desconhecem a si próprios. Perdi a alma em mil tumultos. Explodi lamentos que saíam do coração em línguas adversas. Inquieta, movi-me sem rumo e não encontrei guarida nos lugares mais inóspitos.

Cansada do meu ser, parei, descansei, esperei. Um surdo rumor percorria-me as entranhas, as veias e chegava-me á pele. Não eram recordações de luz nem a determinação de me entronizar num novo ser. Eram memórias do corpo que se reconhecia ilimitado. Era o corpo sem desejo. A túnica que não fora cosida. Em mim irrompeu uma alegria antiga, completa e sem falha. Do profundo centro do meu ser irradiava e transbordava a luz primordial cuja acção é o amor. Amei renovadamente os humanos que me rodeavam. A vida era dádiva da vida e nessa vida me voltei a reconhecer divina. Encarnada mas não esquecida. Divina em todos os átomos do meu ser. Indivisa desde a eternidade.





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