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João Motta

A Cultura


Publicado : 2013-10-26


Cultura é algo que vem de dentro para fora. É o trabalhar e explorar a mina interior da nossa essência e o seu partilhar com os outros.

A cultura não é nem conhecimento nem experiência mas sim aquilo que é comum e universal e se encontra escondido dentro de cada um.

Cultura é autoconhecimento. É a revelação do brilho e faísca de cada um que faz espelho e faz eco na curiosidade, anseio de conhecimento, disponibilidade e trabalho de cada outro.

A cultura é um direito e um dever na base do contrato social. Cultura é o que faz evoluir uma sociedade.

Durante muito tempo falou-se de cultura como algo nacional, de um povo, em contraposição às outras, mas o contributo de Portugal para a humanidade é o saber sentir a universalidade, saber o que é ser humano.

Um responsável público pela cultura deveria pautar a sua conduta e atitude por um alinhamento com os anseios profundos e as necessidades dos seus constituintes.

Nesta altura da evolução da humanidade e de Portugal a necessidade é a de as pessoas descobrirem uma alternativa que as empodere e lhes devolva a confiança em si e nos outros. Essa confiança e estima só podem vir do reconhecimento vivencial da dignidade espiritual do ser humano. Essa dignidade só pode ser comprovada pelo exercer da criatividade e pelo progressivo reconhecimento de que somos completamente responsáveis pela nossa vida momento a momento.

É nessa responsabilidade de sermos e darmos o nosso melhor que germina a cultura. Pois cultura é como vemos o mundo e como agimos sobre ele.

Cultura é sintonizar com os outros e conseguir levá-los a elevar e aprofundar as ideias que tem sobre quem são e sobre qual é o sentido da vida, o para quê viver.

Numa sociedade bastante virada para as aparências e para o entretenimento do ego cansado pelo trabalho alienante, a cultura deve ser um vírus de inconformismo, de ajudar a remover as limitações e os limites à imaginação das pessoas.

O povo que mais contribuirá para a humanidade do futuro será aquele que tenha maior imaginação de conceber e sentir realidades mais vastas. Portugal não sendo um país de civismo colectivo exterior, emana uma espécie de misticismo colectivo interior. E o seu individualismo na relação exterior social preserva a autonomia e a dignidade. É o articular desta autonomia individual exterior com a participação ?mística? interior que define o eixo central da cultura portuguesa.

É o fomentar desse conhecimento e da sua consequente prática que deveria ser o cerne de uma política da cultura.

Um programa de acções culturais que permita e leve à expressão da consciência. Um programa que aposte no efeito multiplicador da cultura portuguesa à escala planetária. Que tem que começar pela cultura individual.

Esse programa incluiria vários tipos de acção. Deveria começar por um levantamento das necessidades verdadeiras e os anseios profundos da população.

Esse processo deveria ser concomitante com a formação dos inquiridores e a formação dos formadores. Um mar com muitas ondas e camadas. Numa moldura e crivo de responsabilidade, serviço e consciência.

Cultura e educação estão intimamente ligadas. Um programa ou canal de televisão virado para o empoderamento cultural seria uma ótima ideia. Seria também necessário alterar os programas escolares infantis visando o maior equilíbrio entre os hemisférios do cérebro, a solidariedade e cooperação e a boa gestão emocional e mental.

Talvez a contribuição Portuguesa consista num melhor articular dos motores da competição e da cooperação.

Por outro lado, seria necessário suscitar uma dinâmica local em que as pessoas interessadas pela política cultural ou pelas suas várias áreas possam aparecer e colaborar.

Finalmente, seria essencial ajudar a redirigir o foco das pessoas para a cultura da abundância, da autossustentabilidade e da cooperação. Isso substituiria a tendência actual para copiar as culturas alheias, em geral anglo-saxónicas, mais regidas pela competição e pela noção de escassez, energética, financeira, emocional e espiritual e pelo domínio crescente do medo.

Assim todos ganham. Só quem perde é o especialismo, a ideia de que se é melhor ou superior aos outros.

Em síntese, mudar da cultura da morte para a cultura da vida!



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